sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

A Deusa-Noiva

Nos tempos antigos as sociedades eram matrilineares – posições e propriedades passadas de mãe para filha. Até o 3º milênio do Oriente Próximo e Médio as mulheres representavam o divino.

Era muito comum a prática de sacerdotisas sagradas. A palavra grega hierodulare = “mulheres sagradas”, foi equivocadamente traduzida pela cultura moderna como “prostitutas” do templo.

A origem dessas mulheres data do período neolítico (7000-3500a.C.), quando Deus era honrado como feminino nas terras conhecidas hoje como Oriente Médio e Europa.

No mundo antigo, a sexualidade era sagrada, dádiva da Deusa do Amor. Essas sacerdotisas eram invocadoras do amor, do êxtase e da fertilidade da deusa. Na antiga Israel era a representada como a deusa Asserá, na Suméria, Inata e na cultura Cananéia, a Astarté. Há vestígios da presença de práticas matrilineares na Palestina, no 1º século.

Há semelhanças entre as imagens eróticas dos Cânticos, na Bíblia e a poesia romântica da Babilônia, da Suméria e de Canaã na Antiguidade.

“Enquanto o rei estava em seus aposentos, o meu nardo espalhou sua fragrância. O meu amado é para mim como uma pequenina bolsa de mirra que passa a noite entre os meus seios”
(Cânticos 1.12,13)
“Entrei em meu jardim, minha irmã, minha noiva; ajuntei a minha mirra com as minhas especiarias. Comi o meu favo e o meu mel; bebi o meu vinho e o meu leite. Comam, amigos, bebam quanto puderem, ó amados!”
(Cânticos 5.1)

A Noiva, Deusa da Lua ou da Terra, era a esposa do Rei-Sol, amiga e parceira do Noivo-Deus – “sua imagem refletida em um espelho, sua ‘outra metade’, um alter-ego feminino ou ‘irmã gêmea’” – motivo pelo qual o símbolo do espelho é mantido na iconografia da deusa. O Noivo arquétipo não poderia ser completo sem ela. “O casamento sagrado do Noivo com sua Noiva-Irmã não se limitava à paixão física, era também uma união de êxtase espiritual e emocional.

Na mitologia “pagã” - pagã no sentido de “não-cristã”, não no sentido do significado da palavra “camponês” - os Deuses do Sol Osíris, Dumuzi e Adônis foram mortos e ressuscitados e, em cada casa, suas viúvas Ísis, Inara e Afrodite, derramaram seu luto sobre o corpo do amado. Conta-se a história que Ísis, Noiva-Irmã de Osíris, orou sobre o corpo mutilado dele e concebeu o filho Hórus após a morte do pai. “Em cada culto é a Noiva que chora a morte do deus sacrificado”.

Deus como feminino:
Nos ritos do Oriente Médio na Antiguidade a Deusa é a Noiva que unge o escolhido, oferecendo-lhe graça e majestade.

Na Suméria, Babilônia e Canaã, ungir a cabeça do rei com óleo era um ritual realizado pela herdeira ou pela sacerdotisa real, que representava a Deusa. Em grego, esse ritual se chama hieros gamos = casamento sagrado. A unção da cabeça tinha significado erótico: a cabeça era o símbolo do falo ungido pela mulher para a penetração durante a consumação física do casamento.

Nesse casamento eram entoadas canções, louvor e agradecimento. Após a consumação era servido um banquete a toda cidade. A bênção da união real era refletida na fertilidade das colheitas e do rebanho e no bem-estar da comunidade.

Através da unção com a sacerdotisa, o rei recebia o status de majestade e ficava conhecido como “o ungido” – em hebraico, “o Messias”. No Oriente Próximo, antigos ritos revelam a Grande Deusa que ungia a cabeça do rei, oferecendo-lhe um banquete e enchendo o seu cálice com bênçãos. Ela atuava como uma advogada que o defendia de seus inimigos.

“Preparas um banquete para mim à vista dos meus inimigos. Tu me honras, ungindo a minha cabeça com óleo e fazendo transbordar o meu cálice”
(Salmo 23.5)

Em alguns cultos da região mesopotâmica, rituais de fertilidade manifestavam o rei eleito pela sacerdotisa do templo local ritualmente sacrificado para garantir a fertilidade da terra. “Plantar” o rei sacrificado significava garantir a fertilidade e prosperidade.

As invasões indo-arianas (aproximadamente 350 a.C.) introduziram a idéia da suprema deidade masculina. Aos poucos, os cultos baseados em um deus masculino de poderes ilimitados, foram substituindo a adoração da deusa. Na Palestina, os profetas assumiram o antigo papel de ungir o rei. Assim, o rei assumiu o papel de representante da deidade. A Deusa foi oficialmente banida na antiga Europa e no Ocidente em 500 d.C., quando seu último templo foi fechado.




Fonte: STARBIRD, Margaret. “Maria Madalena e o Santo Graal”, Rio de Janeiro, Sextante, 2004.

Outras Citações (Versículos): Bíblia Nova Versão Internacional